Depois da maternidade, quem sou eu?
- Isabel Debatin
- 6 de fev.
- 3 min de leitura

Até pouco tempo atrás, falar sobre maternidade de forma sincera era raro. A romantização do maternar nos fez acreditar que esse é um processo instintivo, repleto apenas de amor e plenitude. Mas a verdade é que, junto com o nascimento de um filho, nasce também uma nova versão de quem somos — e essa transformação pode ser tão profunda a ponto de nos fazer questionar nossa identidade.
Nos primeiros meses, tudo gira em torno do bebê. A rotina muda completamente, o sono vira um luxo e as prioridades são outras. Mas e depois? Quando a poeira baixa e o bebê já não é tão pequeno, muitas mulheres se olham no espelho e não reconhecem mais quem veem ali. O que antes fazia sentido — os hobbies, os sonhos, a individualidade — parece ter ficado em pausa ou desaparecido.

"Você cuida do bebê e acaba esquecendo de você. Você fica dias sem ao menos se olhar no espelho. Não que você não queira, mas simplesmente porque você não lembra." Essa frase da Rafaela Carvalho, no livro 60 Dias de Neblina, traduz a sensação de apagamento que tantas mães vivenciam.
A invisibilidade chega sorrateira porque, de repente, o mundo passa a te enxergar apenas como mãe. Você se torna "a mãe do fulano" e, por mais que esse seja um papel extraordinário, ele não deveria apagar os outros lados de quem você é.
Essa sensação tem nome. Pesquisadores chamam de "crise de identidade materna". É o momento em que a mulher percebe que a maternidade mudou suas referências, mas ainda não encontrou um novo equilíbrio entre ser mãe e ser ela mesma. Isso acontece porque, ao longo da vida, aprendemos que uma mãe dedicada é aquela que coloca suas necessidades sempre em último plano.

Mas será que precisa ser assim?
A resposta é não. E cada vez mais mulheres estão falando sobre isso. Nas redes sociais, mães compartilham suas rotinas sem filtro, mostrando que a maternidade real pode ser cansativa e, ao mesmo tempo, linda. Elas falam sobre como se reencontraram, seja resgatando um hobby, buscando redes de apoio ou, simplesmente, permitindo-se ter momentos só para si.
A maternidade transforma, sim. Mas ela não precisa apagar. Você continua sendo você — só que agora com novas camadas, novas histórias e novas formas de existir no mundo. E, por mais que pareça difícil, pequenas coisas podem ajudar nesse reencontro. Às vezes, está em algo simples, como reservar alguns minutos para si mesma, redescobrir aquele livro que ficou esquecido na estante ou se permitir um momento de silêncio com um café quente nas mãos.
"Perder-se um pouco pode ser parte do caminho para nos reencontrarmos mais fortes e plenas."
Também pode estar na troca com outras mães, na conversa sincera com uma amiga que entende, no pedido de ajuda sem culpa. Porque, no fim, ninguém precisa dar conta de tudo sozinha. A maternidade não precisa ser solitária, nem uma abdicação completa de quem você é.

Eu mesma passei por isso. Senti-me isolada, por mim mesma, sem hobbies, sem roupas que eu gostava, sem vontade de sair de casa e, ao mesmo tempo, sem querer estar em casa naquela rotina. Mas, com a ajuda da terapia, aos poucos fui arrumando a bagunça que estava na minha cabeça. Ainda estou nesse processo. E, olhando para trás, percebo que pedir ajuda foi uma das decisões mais importantes que tomei. Porque o apoio emocional nesse período é essencial.
Existem profissionais maravilhosos que podem ser um suporte valioso. Buscar terapia, conversar com outras mães, permitir-se sentir e se reencontrar são formas de tornar essa travessia mais leve.
"O primeiro ano é o piscar de olhos mais lento que você irá viver. E os dias difíceis mais bonitos que irá recordar."
Se há algo que a maternidade nos ensina, é que o tempo não para. Mas, no meio da neblina, é possível encontrar caminhos para voltar a si mesma — com acolhimento, paciência e a certeza de que, depois dela, o sol sempre volta a brilhar.
*Citações do livro 60 dias de neblina | Autora: Rafaela Carvalho.
Um abraço carinhoso,
Isabel Debatin
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