Sempre conectados, mas emocionalmente entorpecidos
- Isabel Debatin
- 16 de abr.
- 4 min de leitura

Você já sentiu que seu cérebro estava… derretendo? Depois de horas no celular, pulando de vídeo em vídeo, rolando o feed sem parar, rindo de um meme e chorando com outro, tudo em questão de minutos? Pois é. Em 2024, essa sensação ganhou nome — e viralizou nas redes: brain rot.
O termo, que significa algo como “cérebro apodrecendo”, foi um dos mais pesquisados do ano, especialmente no TikTok, onde jovens passaram a usá-lo de forma irônica (e um pouco desesperada) para descrever o esgotamento mental causado pelo consumo exagerado de conteúdos rápidos, repetitivos e rasos.
Essa é a nossa forma (meio cômica, meio crítica) de tentar nomear o que acontece com a mente quando ela é bombardeada, o dia inteiro, por estímulos curtos, intensos e, muitas vezes, vazios. A gente consome tanto conteúdo em tão pouco tempo que já nem sabe mais o que viu, o que aprendeu ou o que sentiu. Só sabe que está cansado. Mas continua.
E esse “continuar” tem um preço.
Estudos mostram que o uso excessivo de redes sociais e telas está ligado à dificuldade de concentração, bloqueio criativo e falhas de memória. O cérebro fica tão acostumado à velocidade do feed que perde a paciência com qualquer coisa mais lenta — inclusive com a vida real. Trocamos conversas profundas por mensagens rápidas. Pausas por scrolls. Silêncio por notificações.
Todo mundo usa, mas não da mesma forma. Tem quem use para relaxar, quem use para escapar, quem use porque virou hábito, e quem nem sabe mais por que está usando. O que temos em comum é que, no fim do dia, quase todo mundo sente que está mais esgotado do que descansado.
Além da exaustão, há um fator silencioso por trás do nosso vício em redes sociais: a dopamina. Esse neurotransmissor, associado ao prazer e à recompensa, é estimulado a cada curtida, comentário ou nova notificação. A gente posta, recebe interação, sente prazer — e repete. Mas quando o retorno não é o que esperávamos, vem a frustração, a comparação, a ansiedade. Como explica o psiquiatra Wilker Knoner Campos:
“A dopamina em excesso nos vicia em novidades e em recompensas rápidas. Isso nos tira da realidade e nos impede de viver o presente.”
É por isso que passamos horas consumindo conteúdo e, no final, não lembramos de quase nada. O consumo fragmentado de informações — típico das redes sociais — expõe o cérebro a estímulos constantes, curtos e variados. Isso dificulta o processamento profundo, reduz nossa capacidade de atenção e afeta a memória. Estudos sugerem que o uso excessivo de redes sociais pode inclusive reduzir a matéria cinzenta do cérebro — nas áreas responsáveis pelo controle de impulsos e tomada de decisões.
Aqui em casa, por exemplo, percebi uma mudança nítida quando começamos a limitar o acesso do meu filho mais velho, de 10 anos, aos vídeos curtos. Nos dias em que ele fica longe dos conteúdos em looping, como Reels e Shorts, o comportamento muda. Ele está mais presente, mais disposto, mais equilibrado. E isso vai de encontro com o que a ciência já está mostrando.
O mais preocupante é que isso atinge todas as gerações — cada uma à sua maneira*:
Baby Boomers (1946–1964): não cresceram com tecnologia digital, mas adotaram o uso para se conectar com a família. Ainda assim, enfrentam sintomas de estresse, ansiedade e até nomofobia — o medo de ficar sem o celular.
Geração X (1965–1980): viveu a transição entre o analógico e o digital. São multitarefa, conectados por necessidade, e enfrentam sintomas claros de esgotamento mental.
Millennials (1981–1996): viveram o começo da internet, o Orkut, o MSN. E talvez por isso sejam os primeiros a perceber que exageraram. São a última geração que se lembra de como era viver sem rede social. Essa comparação dá a eles uma perspectiva valiosa — e uma certa responsabilidade.
Geração Z (1997–2012): nativos digitais. Cresceram com TikTok, Instagram, Snapchat. São rápidos, visuais, criativos — e também a geração mais impactada pela comparação, ansiedade e excesso de estímulos. Coincide com o aumento nos diagnósticos de TDAH e autismo.
Geração Alpha (a partir de 2013): nasceram com o celular na mão. Literalmente. Aprenderam a deslizar o dedo antes de falar. Estão sendo moldados por um mundo onde o silêncio e o tédio praticamente não existem. Precisam da nossa atenção — antes que seja tarde.
A consequência disso tudo?
A gente perdeu o costume de fazer pausas reais.
A mente não descansa mais.
O silêncio foi substituído por um looping infinito de estímulos.
Mesmo quando dizemos que vamos descansar, estamos rolando uma tela.
Como reforça novamente o psiquiatra Wilker Knoner Campos:
“A dopamina liberada em excesso gera um comportamento compulsivo. A gente quer mais estímulo, mais novidade, mais vídeo. E isso nos tira da realidade, do presente e da capacidade de estar atento.”
E a neurocientista Carla Tieppo completa:
“A memória precisa de atenção. Quando estamos em constante troca de estímulos, nossa capacidade de consolidar o que vivemos é enfraquecida.”
A verdade é que muita gente já sabe o que precisa fazer. Mas saber não é o mesmo que conseguir. Desconectar dá trabalho. Mas também é uma escolha.
Então, como mitigar tudo isso sem desaparecer do mundo?
Limite o tempo de uso dos dispositivos;
Desative notificações que não são essenciais;
Priorize momentos offline e interações reais;
Pratique o ócio criativo — mesmo que seja no banho;
Crie pausas verdadeiras no seu dia.
No meu caso, desativei quase todas as notificações do celular. No Apple Watch, deixei só o app de exercícios. Nada de redes vibrando no pulso. Se tivesse, eu estaria ainda mais conectada — e consequentemente, mais esgotada.
Estamos sempre conectados. Mas talvez nunca tenhamos estado tão longe da gente.
O seu cérebro não está apodrecendo.
Ele só está pedindo um tempo.
E talvez, o que a gente mais precise agora, não é de mais conteúdo…
É de mais presença.
Qual a sua opinião sobre esse tema? Você você já sentiu que depois de horas no celular o seu cérebro estava apodrecendo? Deixe seu comentário!
Um abraço carinhoso,
Isabel Debatin
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